dezembro 31, 2006


Hora de estrellas


El silencio redondo de la noche
sobre el pentagrama
del infinito.

Yo me salgo desnudo a la calle,
maduro de versos
perdidos.
Lo negro, acribillado
por el canto del grillo,
tiene ese fuego fatuo,
muerto,
del sonido.
Esa luz musical
que percibe
el espíritu.

Los esqueletos de mil mariposas
duermen en mi recinto.

Hay una juventud de brisas locas
sobre el río.

Federico García Lorca

dezembro 28, 2006


Amor aos livros


Vale a pena ler a matéria do El País dedicada à brasileira Beatriz de Moura (foto acima) e sua estupenda Tusquets Editores.

Aqui, apenas um dos melhores trechos: "Quería leerlo todo, de modo que leí de la manera más caótica que pueda imaginarse, ficción de preferencia. Podía pasar con una naturalidad pasmosa de un ensayo sesudo a una novelita de Corín Tellado. Y, cuando ya trabajaba en editoriales, descubrí deslumbrada, casi a la vez, la literatura norteamericana e hispanoamericana. Sin embargo, a partir del momento en que empecé a leer por obligación, o sea, desde que tuve que leer, primero como lectora para otras editoriales y luego como editora yo misma, la naturaleza misma del placer de la lectura cambió radicalmente. Ya no leí sólo para complacerme a mí o instruirme yo, sino también para complacer e instruir a un lector hipotético que, por encima de mi hombro, empezó a compartir conmigo la lectura del mismo libro. Al principio me costó hacerme a esa presencia fantasmal a mis espaldas, pero hace ya mucho tiempo que me he acostumbrado a ella; tanto, que a veces hasta decide por mí…"

dezembro 13, 2006

O anti-romance


Em meu texto deste mês para o jornal Rascunho, escrevo sobre O amanuense Belmiro, de Cyro dos Anjos, o romance brasileiro por excelência, símbolo perfeito deste país, "réplica nova de um reino velho", para usar a frase modelar de Raymundo Faoro.

dezembro 02, 2006


O caminho do leitor


Acaba de ser publicado na Espanha o romance Onde os velhos não têm vez, de Cormac McCarthy (foto), com o título de No es país para viejos. A editora é a mesma, a Alfaguara, que iniciou suas atividades aqui há poucos meses.

Terminei de ler, há poucos minutos, a resenha publicada hoje no El País, escrita pelo escritor espanhol José María Guelbenzu, e ela me fez pensar, primeiro, no duro caminho que um leitor empreende para construir seu próprio juízo crítico. E, logo depois, em uma verdade quase sempre esquecida: que a crítica literária não é uma ciência exata e que, portanto, seu discurso jamais pode ser considerado definitivo.

Onde os velhos não têm vez serve como um exemplo interessante para compreendermos a multiplicidade de argumentos críticos que podem surgir da leitura de uma única obra, e de como toda a produção de resenhas, artigos ou teses nunca consegue dar conta de todos os aspectos de um livro, ainda que alguns críticos tenham essa pretensão, o que não me parece ser o caso, saliento, dos dois nomes citados aqui.

Se compararmos o texto de Guelbenzu, no qual ele elogia o romance, com, por exemplo, uma das resenhas publicadas no Brasil, escrita por Bernardo Carvalho, veremos que um mundo ideal de leitores seria aquele no qual cada um elaborasse sua própria crítica, sem escutar nenhuma outra voz, a não ser a da sua consciência.

Apenas a título de ilustração, seguem abaixo os parágrafos finais de Guelbenzu e de Carvalho:

"McCarthy ha escrito una novela en la que prescinde casi por completo de una de sus mejores bazas literarias: la creación de imágenes de belleza y plasticidad únicas y fascinantes. Aquí escribe con una desnudez extrema, es una escritura ascética de una contundencia demoledora. El sentido del ritmo y el selecto uso de la elipsis son tan potentes que cualquier autor de thriller daría un brazo por llegar a escribir con una tensión tan absorbente. No hay manera de soltar el libro. Es duro, duro e impactante."

"A leitura fácil de Onde os velhos não têm vez, se não deixa de ser prazerosa, também não impõe nenhum desafio. É possível que não haja nada errado nisso. Mas, se é a resistência que nos dá a dimensão da liberdade, talvez não reste outra opção senão se resignar ao fato de que, no mundo concebido pelo desencanto tardio e radical de McCarthy, não são só os velhos que não têm vez. A literatura também não."

novembro 28, 2006

Mineirice e esperança


Quando Sofia nasceu, o Itacolomi estava escondido sob a névoa. Ouro Preto quieta no amanhecer, as calçadas úmidas, nossas vozes abafadas pela noite da espera, o cheiro de lenha queimada ainda tímido no ar e os sinos que anunciavam as primeiras missas: olhávamos a neblina perdidos como o bandeirante Antônio Dias de Oliveira. Em 1698, ao chegar, pouco antes do anoitecer, à entrada do vale do Tripuí, ele não conseguiu divisar o famoso pico – referência para um provável caminho do ouro –, que permanecia "velado pela carapuça de nuvens", diz Manuel Bandeira.

Isso foi há um ano. E cada um de nós, dos que estavam na casa da Rua Henri Gorceix, guarda daqueles dias suas próprias lembranças. Imagino que a memória da mãe deve ser principalmente sensorial. Ela carregou Sofia nove meses inteiros, e naquela manhã nevoenta deu à luz em um parto bíblico, marcado de dores, como se confirmasse o terrível anátema do Gênesis. O pai talvez ainda sinta, ao olhar a filha que dá os primeiros passos, uma ponta da mesma perplexidade daquela madrugada, quando ele subia as escadas somente para descê-las logo depois, até perguntar-me, atônito, "E agora?!". O mais feliz de todos foi João Pedro, que dormia, imperturbável nos seus doze anos, quase cataléptico, graças à ignorância do que é a incerteza ou a ansiedade. Quanto à avó, também acabou cedendo ao sono, mas se abríssemos a porta do quarto, veríamos que, semelhante aos dragões das histórias infantis, ela cochilava apenas com um olho, enquanto o outro, vigilante, esperava pelo terceiro neto.

Um lado de minha consciência julga inconcebível existirem casais, nos dias de hoje, dispostos a procriar. Mas todas as dúvidas caem por terra quando vejo Sofia balbuciando as primeiras palavras. Essas sílabas confusas têm o poder de neutralizar minhas críticas ao amor que, não contente em amar, se submete cegamente à natureza. Sofia dá gritinhos, desarruma as gavetas e os armários, faz caretas e me resigno às suas peraltices, adorando o sorriso que desperta em mim aquele esquecido gozo de viver.

Quem foi a Minas sabe do sotaque indolente das mulheres, das interjeições sedutoras, do "ei..." demorado que nos atrai e enlaça sem deixar espaços à recusa. Essa mineirice perdura e se renova em Sofia, menina marota que resume, em sua fragilidade infantil, nossa condição humana, efêmera, precária. Mas seu jeito mineiro de encantar concede-me alegria – e a imprecisa esperança que, às vezes, acredito esgotada para sempre.

(Crônica publicada na edição de 24 de novembro de 2006, no jornal Bom Dia Jundiaí.)

novembro 22, 2006


Entre o zen e a melancolia


Na última edição do jornal Rascunho, publiquei um ensaio dedicado ao escritor Yasunari Kawabata, de quem a Estação Liberdade tem editado os principais romances, em traduções diretas do japonês.

Kawabata buscou elaborar uma literatura do comedimento, que dissesse menos, mas, por meio das sutilezas que só a cultura japonesa possui, ganhasse uma nova força expressiva. Ele almejou que a experiência da leitura de sua obra produzisse um efeito semelhante ao do exemplo de certo mestre zen: "Antes que um homem estude o zen, as montanhas são para ele montanhas e as águas são águas. Mas quando ele vislumbra a verdade, as montanhas não são mais montanhas, nem as águas são águas. Mais tarde, quando atinge o satori, as montanhas são novamente montanhas e as águas são águas". Ou seja, que seus leitores pudessem vislumbrar a realidade de maneira clara, despida do véu de ilusão com que nossas ânsias e desejos a recobrem.

novembro 14, 2006

Convite a Zama


Lentamente, vamos deixando de dar as costas à literatura em língua hispânica da América Latina, o que significa descobrir que a ficção e a poesia têm muito mais a oferecer do que Borges, Cortázar, Gabriel García Márquez, Neruda e a meia dúzia de escritores até há pouco tempo conhecidos em língua portuguesa.

Desde 2005, por exemplo, a Editora Globo vem publicando os principais romances do argentino Antonio Di Benedetto, de quem acabo de ler Zama. Um livro perturbador, muito distante do que algumas resenhas apressadas definiram como "biografia fictícia". Numa linguagem cinzelada, superior ao derramado palavrório e à retórica nem sempre expressiva de alguns escritores latino-americanos, que são tratados como geniais no Brasil, Zama é um daqueles romances cuja segunda principal qualidade – pois a primeira é a linguagem – reside no poder de nos questionar.

Para Juan José Saer, outro genial escritor argentino, que assina o prefácio de Zama, o romance "não se rebaixa à demagogia do maravilhoso nem à ilustração de tese sociológica; não se obstina em repetir-nos as velhas crônicas familiares que murcham o romance burguês desde fins do século XIX; não divide a realidade, que é problemática, em nações; não pretende ser a summa de nenhum grupo ou lugar; não dá ao leitor o que o leitor espera de antemão, porque os preconceitos da época condicionaram seu autor induzindo-o a escrever o que seu público lhe impõe; não honra revoluções nem heróis de extração duvidosa e, no entanto, apesar de sua austeridade, de seu laconismo, por ser o romance da espera e da solidão, não faz senão representar, a seu modo, obliquamente, a profunda condição da América, que cintila, frágil, em cada um de nós".

Perdoem-me a citação extensa, mas Saer, falecido há poucos anos, é um dos raros escritores que elaboraram uma diversificada e original reflexão sobre a escrita, seus processos criativos e os usos da linguagem.

De Antonio Di Benedetto, quero transcrever aqui um trecho de sua entrevista a Günter W. Lorenz, publicada em Diálogo com a América Latina – panorama de uma literatura do futuro (Editora E.P.U.): "[...] Escrevo porque se põem diante de mim, porque se colocam na minha imaginação, personagens envolvidos em um transe ou possuídos por uma obsessão ou uma esperança, e me empenho em levá-los até o final bem, que às vezes não existe. [...] escrevo porque gosto de narrar. Escrevo por que gosto da ocupação de escrever. Escrevo porque me guia uma vontade intensa de construir, por meio da palavra. Escrevo para analisar-me. Escrevo para esclarecer o que me prejudica, o que prejudica à gente como eu. Escrevo para entender e entender-me. Escrevo para que a subjetividade explore as paisagens abertas e as cavernas sombrias das pessoas que o mundo objetivo lhe propõe. Escrevo para que minha consciência percorra mais regiões do que o mundo objetivo lhe propõe. Escrevo para confessar e não ser absolvido".

Da consciência desse homem nasceu Zama, que ele dedica "às vítimas da espera", ou seja, a alguns de nós.

novembro 02, 2006


Realismo mágico à moda brasileira


Em minha resenha do mês de outubro no Rascunho, escrevo sobre Murilo Rubião e as duas coletâneas (falta apenas uma) de contos até agora publicadas pela Editora Companhia das Letras. Entre outras qualidades, Rubião tem um humor ácido, surpreendente.

outubro 13, 2006


Orhan Pamuk - 2


A edição de hoje do El País traz um lúcido artigo desse escritor turco que, ontem, foi anunciado como o Prêmio Nobel de Literatura deste ano. Três pontos chamaram-me a atenção: as preocupações do artista cuja origem está presa a um país dividido entre as culturas do Ocidente e do Oriente, ou melhor, entre o Ocidente e o Islã; sua visão sobre as relações que unem um novelista aos seus leitores, não só na Turquia, mas em todo o mundo; e, finalmente, o debate proposto por ele, ao tratar da preocupação - ou do medo - de que as literaturas nacionais deixem de falar das suas próprias tradições, preferindo optar por uma expressão universalista, o que, para alguns, significaria uma inevitável perda de autenticidade. Este último ponto é o que me parece mais próximo da realidade brasileira, onde, em minha opinião, parcela dos escritores insiste em aferrar-se a um regionalismo míope, produzindo uma literatura restrita, limitada. De qualquer forma, este é o artigo.

outubro 12, 2006


Orhan Pamuk


Não conheço o ganhador do Nobel de Literatura deste ano, o turco Orhan Pamuk. Mas interessei-me vivamente por sua obra depois de ler uma entrevista concedida ao jornal El País, da qual coloco, abaixo, um pequeno trecho. Assim, já encomendei o exemplar de um de seus romances, publicado entre nós pela Editora Cia. das Letras, Meu nome é Vermelho.

"Bueno, te vas construyendo una vida de escritor, desde luego, y desde ese punto de vista no eres igual a nadie más. Pero con esto no me estoy refiriendo a esa vanidad narcisista de los autores que se creen únicos. Distingamos entre ese narcisismo, que no comparto ni me interesa, y por otro lado el trabajo que hago. La manera en que yo veo ese trabajo, la manera en que escribo mis novelas, es siempre buscando lo que hay en lo más profundo del ser humano e intentando sacar eso a la superficie, para demostrar que todos somos iguales unos a otros. Sí, es verdad, pertenecemos a comunidades diferentes y a veces enfrentadas, la comunidad de la mezquita o del partido político que sea, pero más allá de eso todos somos muy semejantes. Y para poder sacar esa esencia común a la superficie, hay que escribir más allá de las ideas comunitarias, hay que escribir libre de ellas, desde el sentido básico y universal de lo humano. Y hacer esto no es muy común. De ahí la soledad del escritor, no porque seas un individuo especial y único, sino porque tienes que esforzarte en escribir desde fuera de las miradas limitadoras de las diversas ideologías comunitarias."

setembro 25, 2006


"Todas as famílias felizes se parecem, cada família infeliz é infeliz à sua maneira"


Nos últimos tempos, tenho escrito, mensalmente, uma longa resenha para o Rascunho, um jornal dedicado exclusivamente a literatura.

Apesar de ser impresso e, atualmente, distribuído a cerca de cinco mil assinantes, o Rascunho também pode ser lido em sua versão na web.

Na edição deste mês, além de um especial sobre o poeta Ferreira Gullar, comemorando os trinta anos de publicação do "Poema sujo", o jornal traz, dentre outros textos, um ensaio que escrevi sobre o romance Anna Kariênina, de Liev Tolstói, traduzido do russo por Rubens Figueiredo e publicado pela Editora Cosac Naify.

agosto 31, 2006

Eleições 2006


Mentira de tudo, em tudo e por tudo. Mentira na terra, no ar, no céu, onde, segundo o Padre Vieira, o próprio céu mentia no Maranhão, e direis que hoje mente ao Brasil inteiro. Mentira nos protestos. Mentira nas promessas. Mentira nos programas. Mentira nos projetos. Mentira nos progressos. Mentira nas reformas. Mentira nas convicções. Mentira nas transmutações. Mentira nas soluções. Mentira nos homens, nos atos e nas coisas. Mentira no rosto, na voz, na postura, no gesto, na palavra, na escrita. Mentira nos partidos, nas coligações e nos blocos. Mentira dos caudilhos aos seus apaniguados, mentira dos seus apaniguados à Nação. Mentira nas instituições. Mentira nas eleições. Mentira nas apurações. Mentira nas mensagens. Mentira nos relatórios. Mentira nos inquéritos. Mentira nos concursos. Mentira nas embaixadas. Mentira nas candidaturas. Mentira nas garantias. Mentira nas responsabilidades. Mentira nos desmentidos. A mentira geral. O monopólio da mentira.

(Rui Barbosa, em discurso de campanha presidencial na Associação Comercial do Rio de Janeiro, 1919.)

- Pescado no Prosa caótica, da minha querida Maira Parula.

agosto 22, 2006

Resenhas no Rascunho


Nos últimos meses tenho publicado resenhas no Rascunho, um jornal dedicado exclusivamente a literatura. Como não avisei os amigos sobre esses trabalhos, cito abaixo os autores sobre os quais escrevi, com seus nomes linkados aos textos:

Thomas Bernhard

Roberto Drummond

Bertold Brecht

Tahar Ben Jelloun