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novembro 18, 2013

Para iniciar o projeto Relendo os Clássicos, um curso sobre Joseph Conrad

Como anunciei aqui em agosto, já está no ar o primeiro curso da série “Relendo os Clássicos” – e começamos com Joseph Conrad. São 4 aulas, em que falo sobre o romance O Agente Secreto, a novela O Coração da Treva e os contos Mocidade e O Parceiro Secreto. As inscrições podem ser feitas na página do Cedet On-line, na qual se encontram informações detalhadas.

maio 15, 2013

Contradições e a arte de escrever em Theodor Adorno


Em alguns dos fragmentos que compõem Minima Moralia, Theodor Adorno fala sobre a escrita. No seu estilo muitas vezes seco, sempre a um passo de se tornar hermético, ele parece acreditar no que expõe: “Faz parte da técnica de escrever ser capaz de renunciar até mesmo a pensamentos fecundos, se a construção o exigir. Sua plenitude e sua força beneficiam-se precisamente dos pensamentos reprimidos. Como à mesa, não se deve comer até os últimos bocados, nem beber até o fim. Do contrário, nós nos tornamos suspeitos de pobreza”.

É o Adorno burguês quem fala nesse trecho do fragmento 51 – burguês no sentido flaubertiano do termo, aquele que realmente acredita ter abertura de espírito, mas só consegue destilar preconceito. Na verdade, exagera apenas para justificar seu próprio estilo, como, aliás, já fizera pouco antes, quando argumenta que o escritor deve “verificar em cada texto, cada fragmento, cada parágrafo, se o tema central sobressai com nitidez”.

Ora, angústias desse tipo servem à criação de textos fracionários. Há uma divagação – ou, melhor, uma circum-navegação – que não é de todo ruim: recorrer, por exemplo, a outras referências, que aparentemente se distanciam do tema central, apenas para iluminá-lo melhor.

Todo texto exige, em alguma medida, certa retórica. O próprio Adorno não pôde evitá-la. Nesse mesmo fragmento, gasta cinco linhas para compor uma bela metáfora, cuja função é, inclusive, demonstrar que ele sabe escrever direito: “Os textos bem elaborados são como teias de aranha: densos, concêntricos, transparentes, bem estruturados e sólidos. Eles atraem para dentro tudo o que voa e rasteja. As metáforas que os atravessam apressadas e descuidadas, tornam-se para eles presas nutritivas. Os materiais afluem facilmente para eles”.

As duas frases finais não seriam desnecessárias? Elas repetem, com outras palavras, o que está sintetizado nas duas iniciais – mas Adorno não teme usá-las; e, vaidoso, “come até o último bocado, bebe até o fim”. Mas isso é Adorno. Como todo marxista, contraditório.

Na verdade, não se deve “renunciar aos pensamentos fecundos”. Se eles podem, de fato, conectar-se ao tema central, por que não readequar o todo, por que não reescrever e reescrever até atingir o que efetivamente pretendemos?

Mas, sejamos justos, Adorno também acerta. “Nenhuma correção é demasiado pequena ou insignificante para que não se deva realizá-la. Em cem alterações, cada uma pode aparecer isoladamente como tola e pedante; juntas podem constituir um novo nível de texto” – conselho corretíssimo. Da mesma forma que é acertada sua observação sobre os lugares-comuns, muitas vezes “associações de palavras” nas quais “murmura o fluxo indolente de uma linguagem insípida”.

Entretanto, é pena que – ele chega a citar Karl Kraus – sua análise do clichê seja superficial. Mas não poderia ser de outro modo. Adorno não tem como evitar a vagueza, não pode retomar as críticas severas que Kraus fazia à linguagem submetida à ideologia, pois isso significaria ter de atacá-las, a fim de defender o marxismo...

Aliás, é o militante esquerdista quem afirma, no mesmo fragmento: “O sonho de uma existência sem ignomínia, ao qual a paixão pela linguagem se apega quando já não se pode mais representá-lo enquanto conteúdo, deve ser estrangulado com pérfida alegria”. Aí está o pensamento revolucionário, em permanente luta com a realidade, sempre pronto a substituí-la por seus próprios sonhos. O marxista precisa acreditar que a existência só é possível com ignomínia – e deve recusar a linguagem que pretenda reafirmar a dignidade e a glória da vida. Se não o fizer, como justificará a absoluta necessidade da utopia? Se não o fizer, não poderá justificar o que mais defende: que todos os meios são aceitáveis para construir o Paraíso aqui e agora.

Para Adorno, “o escritor não pode aceitar a distinção entre a expressão bela e a expressão adequada ao assunto. [...] Se consegue dizer inteiramente o que pretende dizer, então é belo o que diz”. Mas, logo depois, o militante tenta derrotar o esteticista: “Quem todavia, sob o pretexto de servir com abnegação a uma causa, negligencia a pureza de expressão, está por isso mesmo traindo a própria causa”. O contraditório marxista não sabe o que fazer: primeiro, a beleza é uma categoria que só pode ser medida pela vontade do próprio escritor; depois, há uma “pureza de expressão”, mas que não é definida.

Podemos aproveitar, contudo, os trechos felizes, como este: “O envolvimento afetivo com o texto e a vaidade tendem a diminuir a escrupulosidade. O que se deixa passar apenas como uma dúvida insignificante pode tornar manifesta a falta de valor objetivo do todo”. Quase sempre esquecidas, as duas frases deveriam permanecer à vista de todos os que são ou almejam ser escritores: render-se à vaidade é perder o rigor.

março 05, 2013

Novo curso: Prática de Leitura e Formação do Estilo

Planejei este curso pensando que, antes de tudo, precisamos abandonar a desconfiança e o cinismo que a chamada “modernidade” alimenta em relação à linguagem. Ao mesmo tempo, quem deseja criar seu próprio estilo de escrever deve reaprender a arte da leitura, ferramenta indispensável para:

1. Descobrir as possibilidades expressivas da linguagem; e
2. Absorver e transformar os estilos que se tornaram clássicos.

O curso, que começa no próximo dia 11 de março, via Internet, foi elaborado de maneira que esses dois exercícios sejam feitos de forma concomitante, por meio da leitura e da análise de autores paradigmáticos, não só de ficção.

Ao final do curso, será proposto um exercício de redação – e comentarei, um a um, por escrito, todos os trabalhos.

A seguir, um resumo do que será tratado nas 12 aulas:

Aula 1 – Apresentação do curso. A linguagem, instrumento de comunicação, conhecimento e criação literária. Libertar a linguagem da ideologia.
Aula 2 – Por que ler? Há uma forma correta de ler? Exercício de leitura.
Aula 3 – Leitura como “absorção ativa”. Trata-se apenas de imitar? Ler, aprender e transformar.
Aula 4 – O texto homérico. Sobriedade e síntese. As coisas como elas são, mas transformadas.
Aula 5 – O relato bíblico. A estrutura da vida humana. Psicologia e camadas de sentido.
Aula 6 – Plínio, o jovem: o inusitado descrito sem retórica. Desprezo pela amplificação.
Aula 7 – Tolstói e o detalhe iluminador. Pensamentos e gestos criam uma personalidade.
Aula 8 – A descrição da realidade com delírio e assombro: Hermann Broch.
Aula 9 – A antítese como hábito da inteligência: as cartas paulinas.
Aula 10 – Alegoria, lógica e analogias: a argumentação nos sermões do Padre Antônio Vieira.
Aula 11 – Montaigne: argumentação sem convencimento – o ato de pensar com o “encanto da conversa entre amigos”.
Aula 12 – Paradoxo e ironia: o riso da argumentação em Chesterton. No final da aula, proposta de exercício de redação.

Os textos a serem estudados em cada aula permanecerão disponíveis, com antecedência, na página do Cedet Online.

– Valores, dúvidas e inscrições, basta visitar a página do curso, escrever para livros@cedet.com.br ou telefonar para 19-3249-80 (horário comercial).

setembro 03, 2010

Recado de Borges aos críticos e escritores herméticos

Quando comecei a escrever, pensei que tudo devia ser definido pelo escritor. Dizer, por exemplo, «a lua» era estritamente proibido; era necessário encontrar um adjectivo, um epíteto para a lua. (Claro que eu estou a simplificar as coisas. Sei disso porque escrevi por diversas vezes La luna, mas isto é uma espécie de símbolo que eu fazia.) Bem, eu pensava que tudo tinha de ser definido e que não podiam ser usadas frases com fórmulas comuns. Eu nunca teria dito; fulano de tal entrou e sentou-se, porque isso era demasiado simples e demasiado fácil. Pensei que tinha de encontrar uma forma interessante de o dizer. Agora, descobri que esse tipo de coisas, em geral, é um aborrecimento para o leitor. Mas julgo que a raiz da questão reside no facto de que quando um escritor é jovem sente, de certa forma, que aquilo que vai dizer é bastante tolo ou óbvio, um lugar-comum, e por isso tenta escondê-lo sob uma ornamentação barroca; ou, se não for isso, caso ele se mostre moderno, faz o contrário: põe-se permanentemente a inventar palavras ou a referir-se a aviões, a comboios ou ao telégrafo e ao telefone porque está a fazer tudo o que pode para ser moderno. Depois, à medida que o tempo passa, sentimos que as nossas ideias, boas ou más, devem tentar passar essa ideia ou esse sentimento ou esse estado de espírito para o leitor. Se, ao mesmo tempo, estamos a tentar ser, digamos, um Sir Thomas Browne ou um Ezra Pound, então é impossível. Por isso acho que um escritor começa sempre por ser demasiado complicado – está a jogar diversas partidas em simultâneo. Quer proporcionar um determinado estado de espírito; ao mesmo tempo tem de ser contemporâneo, e se não for contemporâneo, então é um reaccionário e um clássico. Quanto ao vocabulário, a primeira coisa que um jovem escritor decide fazer, pelo menos neste país, é mostrar aos seus leitores que possui um dicionário, que conhece todos os sinónimos de uma palavra […]

Jorge Luis Borges em Entrevistas da Paris Review

(Do ótimo Pó dos Livros.)