agosto 26, 2009

Enriquecer, mas sem perder o discurso jamais

Não está longe o ano de 1957, quando o montenegrino Milovan Djilas, férreo apoiador de Josip Broz Tito, lançou seu bombástico A Nova Classe – análise do sistema comunista, no qual denunciava o surgimento, no bloco dos países da Cortina de Ferro, de uma classe de privilegiados – os revolucionários que, ocupando altos cargos na burocracia, enriqueciam, corrompiam-se e se deleitavam nas benesses do Estado totalitário; sem, é claro, abdicar do discurso populista e demagógico, no qual os batidos chavões do igualitarismo seguiam intactos.

Djilas amargou processos, perda de cargos, expulsão do partido e prisões por conta da coragem, mas suas denúncias e análises, depois aprofundadas no livro Além da Nova Classe, de 1969, continuam atuais. Leiam, por exemplo, a reportagem da edição de hoje do El País: “La oligarquía orteguista”, que mostra como funcionários do governo da Nicarágua – no passado, guerrilheiros que fizeram parte da Frente Sandinista de Libertação Nacional (FSLN) e lutaram contra a ditadura somozista; agora, burocratas do governo Daniel Ortega – enriquecem à sombra do Estado, sem abandonar, contudo, o discurso a favor dos pobres e as críticas à classe alta. Enquanto simulam virtude e defendem a luta de classes, cuidam com extremo carinho da própria conta bancária.

A imprensa brasileira deveria fazer reportagens semelhantes sobre os próceres do esquerdismo nacional. Há quase oito anos no poder, muitos certamente agora já podem viver de maneira nababesca – mas preservando os velhos discursos, pois uma boa pitada de contradição (que eles preferem chamar de dialética) é inerente aos catecismos leninistas.

Um comentário:

Tibiriçá Ramaglio disse...

É isso, Rodrigo. Há que discursar, sem perder a cara dura jamais.

Um abraço,

Tibiriçá