outubro 30, 2007


A cópia monótona da realidade


A convite do poeta Régis Bonvicino, escrevi para a revista Sibila uma crítica sobre o romance O Paraíso é bem bacana, de André Sant'Anna.

outubro 24, 2007


Saldo positivo


A semana, até o presente momento, oferece um saldo positivo. Por uma dessas casualidades com que a vida nos gratifica, minha mulher ganhou duas entradas para o recital do baixo Robert Holl (foto), na Sala São Paulo, nesta última segunda-feira. Fomos, é claro. E que maravilhosa voz! Apesar das canções de Schumann (sobre poemas de Heinrich Heine) e de Tchaikovsky serem belíssimas, Holl alcançou uma expressividade incrível cantando Rachmaninov, especialmente os dois últimos lieder, "Cristo ressurgiu" (versos de Merejkovsky) e "Oh, tu, meu campo semeado" (versos de Aliéksei Tólstoi). A força e o calor da voz de Holl ainda repercutem nos meus ouvidos.

Não foi menos agradável ler a crônica de João Pereira Coutinho, hoje, na Folha de S. Paulo (apenas para assinantes, infelizmente). O escritor português tem o dom de conceder vida à Ilustrada. É, sem qualquer dúvida, o melhor cronista da atualidade. O texto desta quarta-feira catapulta o eu do leitor, lança-o longe de qualquer visão derrotista. Não há melhor forma de se iniciar o dia, ainda mais quando ele está chuvoso e frio - e temos uma quantidade imensa de trabalho sobre a escrivaninha.

outubro 22, 2007


Uma história de amor - uma dilacerante antítese


Escrevo sobre a novela A fera na selva, de Henry James, na edição deste mês do jornal Rascunho. Para ler a resenha, basta clicar aqui.

outubro 11, 2007

A sabedoria de Doris Lessing




outubro 05, 2007

Um último obrigado


Na padaria, ontem cedo, soube que Toninho foi despedido. O homem que me atendeu no café-da-manhã durante os últimos cinco anos acaba de se perder na imensidão de São Paulo. Nunca mais o verei, certamente. E parece-me estranho que esse homem, sempre tão gentil, sempre atencioso, desapareça sem ao menos um último aperto de mão.

Logo cedo, no balcão do café, era Toninho quem se desdobrava, e seu nome podia ser escutado a todo o momento, em meio ao barulho das xícaras, às ordens gritadas para o chapeiro e ao atropelo dos que chegavam ali para a primeira refeição do dia, antes de pegarem o metrô.

Naqueles minutos tensos, quando a turba se amontoava em volta do balcão, fazendo seus pedidos ao mesmo tempo, dando aos tons de voz uma urgência às vezes mentirosa, ele era o único que nunca perdia a paciência. E o que me encantava na sua maneira de atender é que Toninho jamais foi servil. Havia uma leve tensão em seus gestos; possuído de uma agilidade e de uma concentração inigualáveis, ele comandava aquele espaço. Era educado sem ser submisso – qualidade rara em um empregado cuja principal tarefa é atender bem ao cliente, deixá-lo satisfeito, com a sensação de que, entre todos os que circundam a máquina de café e a vitrine de salgados, ele é o mais importante.

Observar o comportamento desse homem significava entender de que maneira alguém pode, apesar da função subalterna, manter sua dignidade, conceder aos seus menores atos certa dose de arte – com que perfeição ele lavava os copos e as xícaras; sua destreza ao preencher as comandas; e sempre, antes de me cumprimentar, tomava o cuidado de enxugar as mãos –, e assim manter-se acima da massa banal. Ser um subalterno, mas transformar seu trabalho em um refinado sistema de gestos, palavras, olhares e certezas.

Temo que ele tenha sido despedido por causa da idade, pois já passava dos quarenta. Mas se foi essa a razão, o que posso dizer, senão lastimar que, vagando por São Paulo ou remoendo suas decepções em alguma humilde casa da periferia, ele esteja impedido de ler este texto e, principalmente, de saber que suas diferentes gentilezas permanecem guardadas em minha memória – e que faço dessas lembranças uma forma de lhe dizer meu último muito obrigado.