agosto 07, 2013

Um personagem busca seu escritor

Sempre digo que a conhecida citação de Oscar Wilde – “A vida imita a arte” – é apenas uma frase de efeito, nada mais, tentativa pueril de criar uma teoria anti-aristotélica, de oposição à mimese. Opor-se à natureza e à vida é, aliás, o tema central da obra – The Decay of Lying – em que a citação se encontra.

Mas este breve primeiro parágrafo não tem o objetivo de iniciar um debate filosófico. Serve apenas ao meu principal interesse, a literatura.

Essas idéias ressurgiram ontem à noite, quando minha esposa comentou sobre uma notícia ouvida no rádio. Minha primeira reação foi lembrar de O falecido Mattias Pascal, de Luigi Pirandello; logo a seguir, da frase de Wilde. E depois de ler a história com atenção, percebi que a vida, mais uma vez, oferecia novos caminhos à arte.

A história de Pedrito de Jesus Conceição, portanto, aguarda por um bom escritor. Alguém preparado para captar os meandros da breve existência desse homem tido como morto, depois vivo, mas que finalmente morre; antes, contudo, que o Estado lhe conceda seu “atestado de vida”. Homem que, apesar de trazer o substantivo “conceição” no nome, morreu várias vezes, de diferentes formas. Parafraseando Pirandello, trata-se de um personagem que busca seu escritor, alguém disposto a entender esse drama familiar nada desprezível, no qual a morte se estabelece e se prolonga num misto de confusão, tristeza, humor negro e dependência do Estado.

Ainda existiria esse escritor, humilde o suficiente para entender que só resta à arte imitar a vida? E que tal trabalho, de imitar a vida transformando-a, tem seu mérito indiscutível?

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