novembro 10, 2014

Escritores e gramática

Sempre insisto com meus alunos sobre a questão da gramática. Muitos acreditam que se tornarão ótimos escritores apenas estudando Napoleão Mendes de Almeida. “Mas o que você quer ser”, eu pergunto, “um escritor ou um gramático?”. Um escritor não precisa conhecer a definição de verbo defectivo — mas precisa ao menos intuir, graças a seu convívio diário com a língua, que certos verbos não apresentam todas as formas de tempo, de pessoa, etc. Ele sabe que seu personagem, referindo-se à falência de sua empresa, só pode dizer “eu fali”, no passado, pois, no presente, esse verbo existe apenas quando usamos “nós” ou “vós”. Esta é uma forma de conhecer como os verbos defectivos funcionam. E uma dúvida facilmente resolvível em qualquer dicionário da Web, pois todos oferecem a conjugação dos verbos. O mesmo acontece quando se trata da pontuação. O jovem escritor pode decorar tratados sobre o uso da vírgula — mas é a leitura atenta dos bons escritores que o ensinará a pontuar. Visitar os capítulos da gramática, principalmente aqueles — a maioria — que não foram explicados na escola, é meritório e certamente ajuda. Mas o bom escritor precisa ir muito além de um conjunto de prescrições e regras.

6 comentários:

  1. Caro Prof. Rodrigo,
    Há muitos anos, um escritor já falecido disse que meus escritos, simples bilhetinhos domésticos, eram um primor pela clareza da expressão, pela correção do uso do vocabulário e até pela caligrafia cuidadosa. Sei que escrevia bem não só bilhetinhos. Quase trinta anos se passaram e encontro-me na triste situação de não mais saber escrever, de não mais usar corretamente a gramática e, pior, de não conseguir ler adequadamente. Vários foram os motivos que me levaram a esta situação e um deles, acredito, foi o exercício da minha profissão. Redigi muito e li muito, uma enormidade. Tornei-me especialista em um tipo de redação formatada, mínima, muito objetiva e composta de jargões, e em um tipo de leitura de carregação, aquela leitura feita para resolver rápido problemas diversos, pulando de uma a outra palavra-chave e apreendendo as conclusões principais do conteúdo quase que por adivinhação, achando tudo obvio, enquanto resolvia outros tantos problemas 'bem mais importantes' também totalmente diversos.
    Gustavo Corção, no livro A Descoberta do Outro, com este breve parágrafo fez a caridade de me ajudar a dar a explicação acima: “Nesse modo de vida apurei um certo folego lógico que me fartava a razão e que ainda por cima me dava um certo prestígio. Levei tempo para descobrir que aquela faculdade se desenvolvera a custa de uma atrofia...”.
    Realmente é uma situação de atrofia, que só as suas lições de calma, esforço e humildade podem dela me tirar.
    Abraço,
    Cristina Garabini
    Ps. preciso de tempo também.

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  2. Cristina: estamos sempre lutando para superar certos hábitos. Às vezes, precisamos apenas descobrir qual muleta pode nos ajudar mais. :-)
    Procure ler aqueles autores que têm um estilo completamente diferente do seu — tenho certeza de que esse exercício vai ajudar muito.
    Um abraço!

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  3. Esse comentário da Cristina me fez pensar uma coisa curiosa: eu também, em certos momentos, tenho a impressão de que hoje escrevo pior do que escrevi no meu auge, entre 2008 e 2011. Tenho menos paciência ou menos 'iluminação'? Não sei. Apenas sei que a busca pela beleza parece ter sido substituída pela busca do fim da história. Isso piorou depois que tentei participar do NaNoWriMo de 2013 com a ideia de terminar um romance meu que estava parado há anos. Não terminei o romance, fiquei com ainda mais dúvidas.

    Em parte isto é porque eu hoje leio menos do que naquela época (meu trabalho anda esgotando minha paciência), mas recentemente eu retomei as leituras, de Agualusa e Philip K. Dick, por enquanto. Espero que essa atrofia seja passageira.

    Eu tenho alguns textos que eu preciso superar.

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  4. Há períodos assim, José Geraldo. E o seu auge não está tão distante. Basta retomar o romance com disciplina, nem que seja uma hora por dia. No começo talvez seja difícil, mas só no começo. Um abraço!

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  5. Caro Prof. Rodrigo,
    Gostei demasiadamente do seu Blogger. Entre idas e vindas de pesquisas esperançosas, me encontrei em um "vórtex" de boas discussões, ideias e pensamentos de uma temática, por mim tão querida. Pois assim, como muitos amo a "palavra escrita" - mesmo que dela eu não seja bom "artífice". E concordo que escrever está além do bom uso da gramática... É a leitura dos "bons"! E também a criação da sua própria magia. Ao seu modo... Ao seu jeito.
    Mesmo assim, gostaria humildemente que o Sr. indicasse um gramática para os aspirantes a escritores. Uma gramática descomplicada. Algo que não tive na vida escolar.
    Um grande abraço, de um leitor seu!!
    Gustavo Alcântara

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  6. Olá, G. Alcântara.
    Minha gramática de uso diário é a "Nova Gramática do Português Contemporâneo", de Celso Cunha e Lindley Cintra.
    Um abraço!

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