Em março de 2009, neste blog, falei sobre o texto de dois críticos que atuavam em campos
diferentes do meu: Luiz Américo Camargo, na gastronomia, e Lauro Machado Coelho, na música erudita.
O que afirmei na
época continua valendo: ambos recusam o discurso dúbio – a crítica ambígua sempre
esconde covardia intelectual – e seus textos são destituídos da empáfia, cada
vez mais comum, de quem pretender criar um novo gênero literário, quase sempre
carregado de linguagem hermética.
Lauro,
infelizmente, não escreve há bom tempo. Mas Luiz Américo continua a presentear os leitores com seu texto leve, sem metáforas excêntricas e, o principal, sem
medo de avaliar, de forma clara e isenta, os restaurantes que visita.
Críticos assim
não devem permanecer confinados à página do jornal; seus trabalhos merecem um
número crescente de leitores. Foi, portanto, uma agradável surpresa descobrir
que Luiz Américo lançou o primeiro livro. Agradável por dois motivos: primeiro,
porque minha mulher e eu gostamos de cozinhar; fomos criados por mães, avós e
bisavós que cultuavam os bons pratos e as receitas familiares, de geração a
geração. Nossas cozinhas sempre foram um espaço de convivência fraternal e
descobrimos nelas, todos os dias, alguma forma de alegria. E o segundo motivo: o
livro de Luiz trata do alimento que é a síntese da nossa cultura: o pão.
Não me
aprofundarei aqui em simbolismos – e não listarei as dezenas de lembranças que
explodem na minha memória quando sinto o perfume dos pães que acabam de sair do
forno. Seria repisar sensações comuns, conhecidas por todos. Mas é exatamente
aí que nasce a importância do livro de Luiz Américo: falar de algo que, sob uma
aparência trivial, esconde a base da civilização.
Acrescente-se a esses fatores o saboroso texto
do autor – vejam, por exemplo, a crônica “As mãos sujas”, em que ele mescla
existencialismo à arte de fazer os próprios fermentos – e teremos um livro que,
além de todos esses prazeres, tem a delicadeza de nos ensinar a fazer o pão de
cada dia.
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