Para os que conhecem a obra do cardeal Ratzinger – infelizmente pouco divulgada em nosso país, ainda hoje influenciado por uma teologia esquerdizante e contrária à tradição católica –, bem como suas falas nas audiências das quartas-feiras, nestes seis anos de papado, quando tratou, entre outros temas, das principais figuras da Patrística e dos grandes teólogos da Idade Média, não há nenhuma surpresa: ele consegue reunir erudição, clareza e rara capacidade de síntese.
Hoje, para se pronunciar sobre um dos temas mais caros à cristandade, Bento XVI começa falando sobre as antigas culturas pagãs – e parte da súplica de um egípcio cego para encontrar o princípio e núcleo de toda oração: “Que eu veja!”. Passa pela Mesopotâmia, chega à Grécia platônica, cita Eurípides e sua As troianas, recorda Marco Aurélio e alcança Proclo de Constantinopla (não o discípulo de São João Crisóstomo, mas o chefe da escola neoplatônica de Atenas, comentarista de Os elementos, de Euclides, e chamado de escolástico do helenismo).
“A vida humana é uma mescla de bem e mal, de sofrimento imerecido e de alegria e beleza, que de forma espontânea e irresistível nos impulsiona a pedir a Deus a luz e a força interiores que nos socorram na terra e abram uma esperança que ultrapasse os limites da morte”, diz Bento XVI.
Próximo de concluir a audiência, ressaltando como o homem, em diferentes épocas e culturas, sempre dá testemunho de sua dimensão religiosa – pois “não pode prescindir de perguntar-se sobre qual é o sentido da sua existência, que permanece obscuro e desconfortante se não se colocar em relação com o mistério de Deus e do seu projeto sobre o mundo” –, Bento XVI nos recorda, em breves linhas, o mistério da Revelação.
Mas esta primeira aula é apenas um sopro do que nos aguarda nas próximas semanas, quando ele discorrerá sobre as formas de encontro com Aquele que, ao manifestar-se a Elias, no Horeb, foi antecedido por grande e impetuoso furacão, capaz de fender montanhas e quebrar rochedos, por um terremoto, pelo fogo – até finalmente se apresentar como o murmúrio de uma brisa suave, diante da qual o profeta cobre seu rosto (1 Reis 19).
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