Como o fotógrafo, o escritor deseja fazer sua própria interpretação da vida |
O fotógrafo Henri
Cartier-Bresson dizia que, na verdade, não era a foto em si que o interessava.
O que ele queria era “capturar uma fração de segundo do real”.
O desejo do
escritor é semelhante. Ele não está — ou não deveria estar — preocupado com o
livro em si, com a obra exposta numa reluzente livraria. O que o escritor
almeja é desvendar um ou mais aspectos da existência, fazer sua própria
interpretação da vida.
Aliás, o trabalho
do escritor é semelhante ao do fotógrafo: o diafragma da câmera não escolhe
sozinho a cena a ser capturada — e, para cada imagem escolhida, dezenas são
desprezadas.
Se fosse de outra
maneira, se nos bastasse o mero retrato da realidade, não precisaríamos da
literatura e de outras formas de arte. Bastaria colocar câmeras em cada
esquina, em cada casa, e permitir que qualquer um assistisse o que quisesse,
quando quisesse.
A inutilidade de
algo assim é tão evidente, que até mesmo um programa vulgar como Big Brother
Brasil está sujeito a uma série de manipulações e provas, e supostos
interrogatórios, traições e acordos — enfim, um complexo sistema ficcional,
ainda que ordinário e grosseiro — para se tornar atraente.
Voltando à ficção
literária, se quiséssemos listar os diferentes aspectos da vida humana,
bastaria reler as principais narrativas. Um conto breve como “O colar”, de
Maupassant, fala mais sobre fuga da realidade, orgulho e amor do que dezenas de
tratados de psicologia.
Não foi a obra enquanto produto final que
despertou o interesse de Maupassant, mas a possibilidade de capturar um
sentimento, um comportamento, determinada situação, de uma forma que, ele intuía,
só Maupassant poderia apreender.
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