O sofredor derrotado
“Tudo aquilo em
que o ser humano acreditava no século XIX [...] tornou inevitável que o herói
do romance realista não fosse um herói, mas um sofredor que acaba sucumbindo.”
Sapateiros
“[...] Ontem à
noite, na cama, eu estava lendo uma coletânea de artigos de Stendhal. Um deles
me divertiu bastante, me comoveu. Stendhal estava dizendo como eram sortudos os
escritores da época de Luís XVI por não terem ninguém que os levasse a sério. A
obscuridade lhes era valiosa. Corneille estava morto havia dias quando alguém
na corte julgou o fato importante o bastante para ser mencionado. No século
XIX, diz Stendhal, teria havido diversos panegíricos públicos, e os funerais de
Corneille seriam cobertos por todos os jornais. Há enormes vantagens em não ser
levado a sério demais. Alguns
escritores são excessivamente sérios em relação a si mesmos. Aceitam as ideias
do ‘público culto’. Existe essa coisa de pôr em maiúscula o A do artista.
Certos escritores e músicos compreendem isso. Stravinski diz que o compositor
deveria praticar seu ofício exatamente como faz um sapateiro. Mozart e Haydn
aceitavam encomendas – compunham sob encomenda. No século XIX, o artista
esperava altivamente pela Inspiração. Uma vez que você se alce ao nível de
instituição cultural, está em apuros.”
O absurdo da elegia
“[...] A
literatura moderna foi dominada por um tom de elegia, dos anos 20 aos anos 50,
a atmosfera de Eliot em A terra desolada,
e ade Joyce em Retrato do artista quando
jovem. A sensibilidade absorveu essa tristeza, essa visão do artista como
único elo contemporâneo violentado em seus (patrícios) sentimentos por todos os
aspectos da civilização moderna. Isso foi muito mais longe do que deveria ter
ido. Caiu no absurdo, do qual acho que já tivemos o bastante.”
Literatura russa
“[...] Os russos
exercem uma atração carismática imediata [...]. Suas convenções lhes permitem
expressar livremente sentimentos sobre a natureza e os seres humanos. Nós
herdamos uma atitude mais constrangedora e aprisionante em relação às emoções.
Temos que contornar as imposições puritanas e estoicas. Falta-nos a abertura
russa. Nossa trilha é mais estreita.”
Como resistir ao niilismo
“[...] Parece
que o que perguntei em meus livros foi: ‘Como é que se pode resistir aos
controles desta vasta sociedade sem
virar um niilista, evitando o absurdo de uma rebelião vazia?’. Perguntei: ‘Existiriam
outras formas, mais bondosas, de resistir e de escolher livremente?’. Acho que,
como a maioria dos americanos, dei preferência ao lado mais reconfortante, mais
meliorista da questão. Não estou dizendo que deveria ter sido mais ‘pessimista’,
porque descobri que o ‘pessimismo’, em quase todas as suas manifestações, é tão
vazio quanto o ‘otimismo’. Mas sou forçado a admitir que não aprofundei essas
questões o bastante. Não posso me culpar por não ter sido um severo moralista;
sempre posso dar a desculpa de que, afinal de contas, não sou nada amis que um
escritor de ficção. Mas não me sinto satisfeito com o que fiz até agora, a não
ser com o lado cômico.”
O caminho mais sábio e mais viril
“[...] Cansei-me
da solenidade da queixa, perdi mesmo a paciência com a queixa. Compelido a
escolher entre a queixa e a comédia, escolhi a comédia, como mais energética,
mais sábia e mais viril.” [Refere-se ao romance Herzog.]
Acredito de modo limitado em coincidências... o caso é hoje mais cedo um conhecido virtual provocou uma discussão acerca das mudanças na literatura acerca da expressão (ou não) de sentimentos. Ele defende (com mais arcabouço teórico que eu) que "os textos apenas expressam as mudanças sociais. Os sentimentos negativos em estão em relevo maior da década de 70 pra cá." Já eu penso que essa ausência de expressão de sentimentos tem relação com um certo policiamento que acaba por "enquadrar"a grande maioria dos autores dentro de um modelo mais aceito pela crítica e/ou pela academia. E eis que venho ler esses recortes da entrevista de Bellow (um dia depois de ter visto a adaptação para o cinema de Anna Karienina).
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