junho 05, 2009

Os melhores dias

As manhãs frias lembram-me a infância. São recordações intensas, vívidas. Assim que desperto e começo a me levantar, vejo-me criança, colocando o uniforme no quarto ainda escuro e sentindo o impacto dos tecidos gelados contra a pele. Esse desconforto, no entanto, dura pouco. Eu me lavava com prazer na água que parecia quebrar entre os dedos, e a cada golpe do líquido no rosto, uma sensação de revigoramento me invadia, como se o choque de temperaturas expulsasse para sempre a morbidez noturna. Minha mãe esperava-me na cozinha, o café sobre a mesa. E enquanto ela tremia, eu já me tornara elétrico, alerta, falante. Poucos minutos depois, caminhava na 11 de Junho, observando as calçadas cobertas de orvalho, o verde das árvores impregnado de um brilho mais puro, e percebendo, a cada passo, a suave cumplicidade do sol. O verão desaparecera. Toda a natureza refreara seus ímpetos e eu não tinha de vencer o mormaço que embotava meu cérebro. Era uma alegria cruzar o jardim público vendo a massa encapotada de crianças e jovens, aquele mar azul-marinho de cabeças inclinadas sob o frio, enquanto eu me sentia renascer, pronto a qualquer aventura. Tudo se revestia de uma beleza nova, incluindo as meninas, obrigadas a usar a saia do uniforme, trêmulas e adoravelmente frágeis apesar das meias de lã e dos capotes. Olho pela janela as pessoas lá embaixo, centenas de agasalhos multicoloridos movendo-se na direção do metrô, e meu impulso é estar entre elas, deixando que o frio afague meu rosto, seguindo, alegre, movido pela urgência da fuga, rumo aos melhores dias da infância.

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