junho 30, 2007


Tão semelhante ao Brasil...


Durante esta última semana, realizou-se em Sevilha, Espanha, com o apoio da Editora Seix Barral e da Fundação José Manuel Lara, um Encontro de Novos Narradores.

Os comentários do jornalista José Andrés Rojo - que, entre 1997 e 2001, foi o coordenador das páginas de livros do jornal El País, passando, depois, entre 2001 e 2006, a editor de Cultura do mesmo jornal - mostram uma terrível semelhança com a realidade brasileira.

No dia 28, o mercado foi a obsessão e reinaram as banalidades:

Se habla más de cine que de literatura. No se ha hecho casi ninguna mención a los escritores españoles de generaciones anteriores (los latinoamericanos prácticamente ni existen). La política está proscrita. El mercado es una obsesión. La queja, un estribillo permanente que no debería haber tenido tanto protagonismo. Lo suyo es que ayer se hubieran enfrentado, por ejemplo, quienes defienden la literatura como entretenimiento con aquellos que le piden algo diferente. Reinaron las vaguedades.


No dia 29, finalmente, enterraram a crítica. O comentário irônico de Rojo dá bem o tom. E, enquanto leio, tenho um desagradável déjà-vu:

El viejo afán de elaborar argumentos para defender el propio gusto, la búsqueda de relaciones entre unas obras y otras más lejanas o anteriores, la exploración del contexto en el que se producen y de las referencias biográficas o generacionales de quienes las han producido, la voluntad de descubrir el motor que alimenta una pieza determinada y las estrategias formales que despliega, el complicado desafío de razonar unas preferencias y de establecer una jerarquía de valores, el arriesgar unas señales para no perderse en la selva de títulos que aparecen cada año… Cultivar, en definitiva, el espíritu crítico heredado de la Ilustración. Todo eso ya no sirve.

No sirve en un mundo donde todo vale...

junho 28, 2007


Bruno Tolentino (1940-2007)


Talvez

Vem quase todo dia
aquela hora muito lenta, aquela
oscilação da hora fria
em que a sombra amarela

do dia embobinado na procela
balança, assume a forma esguia
de um casulo, e sugere a agonia
de algum verme: antecipa-se a bela,

a futura, a perene borboleta,
e é como a eternidade
que se insinua, a esquiva silhueta

pairando como às voltas de si mesma
com um aroma de luz e de umidade:
a alma entre o nada e a lesma?

II

Algo intangível anda pelos cantos
deste lugar estreito
quando os corpos transbordam do leito
e enrolam-se nos mantos

de uma conspícua viuvez, os agapantos
dos campos desolados do perfeito...
Algo que agora não se vê direito,
se algum dia se viu, entre tantos

trapos, espectros, ângulos, promessas...
Algo invisível como a própria alma
balança-se com a calma

dos morcegos que dormem com as cabeças
apontadas de dia para o chão.
Há resquícios assim em mim. Acordarão?

(De As horas de Katharina, Editora Cia. das Letras, 1994.)

junho 26, 2007



Hermann Broch


A Editorial Igitur acaba de lançar, na Espanha, uma edição das poesias completas de Hermann Broch. À parte o fato de estarmos sempre atrasados - e não só em relação ao mercado editorial de língua hispânica -, o lançamento me permitirá ter acesso aos poemas desse escritor magnífico, de pouquíssimos leitores no Brasil, cuja principal obra, A morte de Virgílio, foi traduzida entre nós por Herbert Caro.

Em seu romance-poema, como bem o definiu Franklin de Oliveira, Broch "lida com metaproblemas, ao fazer jorrar sobre a aporia insolúvel de questões como a morte, a eternidade e a personalidade (a pessoa humana), inaudita luz, na tentativa de arrancar tais questões da condição de enigmas".

A seguir, um trecho da quarta e última parte de A morte de Virgílio, "Éter - o retorno":

A flutuante, intuitiva saudade começava a cumprir-se, convertia-se em flutuante realização. Pairando, como o garoto na proa, tendia o saber, tendia a jornada ao descanso no adejo comum, e quanto mais isso durava, quanto mais se prolongava o crescimento da noite e do barco noturno - incalculável a duração, incalculável qualquer medida, a claridade da noite impregnada de sombra, saturada de sombra! - tanto mais fugaz se tornava a voluteante figura do garoto; fugaz e mais fugaz, desnuda e mais desnuda tornava-se ela, conchegada ao clarão estelar, conchegada à obumbração, despojada da vestimenta e mais do que apenas dela, desvestido até a mais completa diafania; assim adejavam, mutuamente abraçados, o menino e a noite, oh, tão diáfanos! Ainda não e todavia já,... seria este o adro da realidade? O adro de sua terra natal, acima da qual giram todos os sóis, todas as luas, todas as estrelas, enchendo-a de esplendor?

junho 22, 2007


Miragens de Kafka


Na edição do jornal Rascunho deste mês, escrevo sobre quatro livros que analisam a vida e a obra de Franz Kafka, publicados no Brasil nos últimos meses: Kafka, de Gérard-Georges Lemaire (L&PM Editora); Kafka de Crumb, de Robert Crumb e David Zane Mairowitz (Editora Relume Dumará); K., de Roberto Calasso (Companhia das Letras); e Kafka: pró & contra, escrito por Günther Anders (Editora Cosac Naify).

junho 19, 2007


"Cuando las cosas acaban ya tienen su número y el mundo depende entonces de sus relatores, pero por poco tiempo y no enteramente, nunca se sale de la sombra del todo, los otros nunca se acaban y siempre hay alguien para quien se encierra un misterio. Ese niño no sabrá nunca lo que ha sucedido, se lo ocultarán su padre y su tía y se lo ocultaré yo mismo y no tiene importancia porque tantas cosas suceden sin que nadie se entere ni las recuerde, o todo se olvida y prescribe. Y cuán poco va quedando de cada individuo en el tiempo inútil como la nieve resbaladiza, de qué poco hay constancia, y de ese poco tanto se calla, y de lo que no se calla se recuerda después tan sólo una mínima parte, y durante poco tiempo: mientras viajamos hacia nuestra difuminación lentamente para transitar tan sólo por la espalda o revés de ese tiempo, donde uno no puede seguir pensando ni se puede seguir despidiendo: 'Adiós risas y adiós agravios. No os veré más, ni me veréis vosotros. Y adiós ardor, adiós recuerdos'."

Javier Marías - Mañana en la batalla piensa en mí

junho 14, 2007


"Narrar no consiste en copiar lo real, sino en inventarlo, en construir imágenes históricamente verosímiles de ese material privado de signo que, gracias a su transformación por medio de la construcción narrativa, podrá al fin, incorporado en una coherencia nueva, coloridamente, significar."

- Juan José Saer (1937-2005)

junho 09, 2007

Lendo o blog do Lucas Murtinho, descobri a entrevista que o escritor Antonio Fernando Borges concedeu a Pedro Sette Câmara. Faço questão de divulgar as respostas do Borges aqui, não só pelo fato de concordar com muitas das suas idéias, mas porque elas sempre instigam, provocam. Para confirmar o que digo, basta, por exemplo, ler a entrevista dele concedida ao Jonas Lopes ou o polêmico artigo "Publicar é preciso. Escrever não".